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sexta-feira, 5 de abril de 2013

PARA GISELA MATA. O AMOR É PARA SEMPRE....


A HARPA FLUTUANTE.
     Embarcado no pequeno, porém valente barco Maria-Maria ІІ.Setembro de 1999, rumando para o arquipélago de Abrolhos. Este barquinho é uma escuna de madeira que lembra muito os barcos sardinheiros de Santa Catarina e de Portugal. A tripulação composta pelo mestre Cosme e o marinheiro Marquinho não fugiu a tradição do mar e dos pescadores, que é a de serem gentis e prestativos.
     Além da tripulação, contava entre os embarcados, Fábio, instrutor de mergulho, Enrico, fotógrafo e cinegrafista subaquático, Gisela Mata, diretora do programa “mochilão-mtv”, Babi, apresentadora, Raul de Góes operador-de-câmera e este “amarfanhador” de frases que aqui escreve.
     A ideia era passar uma semana no arquipélago de Abrolhos, gravando o programa “Mochilão-mtv”, voltado para o público jovem e interessado em dicas de lugares interessantes para visitar.
     Passado o momento inicial, quando nossa nau fez-se ao mar e tendo os níveis de adrenalina devidamente acomodados, restou sossegar e apreciar o dia, incrivelmente belo, com  céu azul e nuvens branquinhas como carneiros. Navegando horas e horas e a todo o momento a rotina do navegar sendo interrompida pelos gritos de: ”olha ali, é um golfinho!” Ou então: “Olha lá a baleia!”. Confesso que prestei mais atenção em seres menores do que estes, mas, que me causaram uma impressão tão boa quanto.Cardumes de peixes voadores, tartarugas nadando na superfície e um incrível desfile de águas-vivas, conhecidas como caravelas, em tal número que a quantidade perdeu logo o significado.
      Finalmente chegamos à ilha principal de Abrolhos, e só lá e que ficamos sabendo que não é permitido o pernoite na ilha, o comum é dormir e permanecer no barco. Notícia que causou um muxoxo, principalmente entre os marujos de terra firme como eu.
      Não consegui dormir no interior do barco devido ao enjoo  e tratei de arrumar um lugar no convés onde preparei um bom “ninho-de-rato”, usando uma lona listrada enorme e já endurecida pelo sal, que se moldou ao meu redor como uma casca-de-ovo, onde nem o vento e nem a garoa fina puderam me incomodar, contei ainda com o auxílio luxuoso de um travesseiro e dois lençóis.
      Gosto imensamente do mar e não achei nada ruim dormir ao relento, tendo as estrelas e às vezes a chuva como teto. E se no interior do barco o chacoalhar causava desconforto e enjôo, no convés, com a brisa e o visual da ilha recortada na escuridão da noite e os inúmeros riscos das estrelas cadentes percorrendo o firmamento, só serviram para me embalar no melhor dos berços.
      No dia seguinte usando um snorkell e pés-de-pato, mergulhei sob o casco do barco e fiquei cara a cara com um badejo de quarenta quilos. O tamanho da mandíbula do bicho era impressionante e assustador.Ainda bem que badejos não comem gente ou aquele não estava com fome!Caberiam facilmente duas cabeças naquela bocarra antediluviana...
Que passeio! Existem verdadeiros jardins submersos onde em meio aos corais pululam centenas de peixes com todos os formatos e cores. Segurando o fôlego, cheguei perto de uma arraia que “voava” ao redor de um coral conhecido como “cérebro”. Fiquei hipnotizado com seus movimentos ondulantes e graciosos, e só lembrei de sair daquele mundo porque não possuindo guelras meu ar faltou e me obrigou a nadar rápido rumo á superfície.
      O mergulho autônomo foi quase desastroso. O sol já se ocultava no horizonte, a luz bem consumida e ainda por cima observei o instrutor de mergulho com um cigarrinho de artista em uma das mãos, o que me deixou um pouco apreensivo.Minha roupa de mergulho estava com o zíper quebrado e a água entrando me deixou literalmente congelado!
      Encantado com a beleza e juventude da nossa diretora, Fábio o instrutor esqueceu completamente da minha presença e aliado a isso a visibilidade estava muito ruim por conta das partículas em suspensão e pouca luz e aconteceu o que eu não queria: perdi o contato visual com os meus dois companheiros de mergulho! Foi uma sensação péssima, pois sem experiência em mergulhar, não tinha a menor ideia de como emergir em segurança ou como evitar os riscos de sofrer uma embolia.
“E essa agora caray!” __ Pense!Pense!__ Lembrei que o indigitado moço, falou algo á respeito de emergir lentamente nadando abaixo das menores bolhas de ar que saem do tubo respiradouro. Cruzei os dedos e foi o que fiz, e quando respirei o bem-vindo ar da atmosfera, estava feliz apesar do “coração-na-boca”, por não ter explodido os pulmões, tampouco os meandros cerebrais!
      “Desgraça pouca é bobagem” é um ótimo axioma, pois dei uma corrida d’olhos e vi agora muito assustado que o bendito barco estava á minha esquerda, muito, muito longe, um pontinho no horizonte! Deslumbrado com a bicharada marinha não percebi o quanto havia me distanciado não só dos meus companheiros de mergulho, mas também do Maria-MariaІІ.
E havia a agravante de que na superfície eu tinha que lutar contra o vento, além da forte correnteza que teimosamente me afastava do barco... Lutar é bem o termo, levei duas horas para chegar ao barco e dei graças por não ter descuidado dos exercícios físicos, pois foram milhares de braçadas e pernadas que pouco me impulsionava frente ao vento e a maré e em nenhum momento sofri com câimbras ou dores musculares. A única testemunha da minha nervosa e assustada abordagem foi o discreto Raul De Góes, que apenas comentou a minha palidez, deixando tudo por isso mesmo...
     Báh! Não caio em outra dessa tão cedo meu velho! De qualquer jeito fiquei tão aliviado de não ter feito cagada na hora de emergir, tão contente por não ter encontrado com um tubarão, afinal era noite e eu ali batendo pernas e braços com estardalhaço suficiente para chamar a atenção, eu o otário ideal! Nem consegui ficar brabo, pelo contrário, só fiz agradecer ao Profundo Poder Da Criação várias vezes!

     Depois de todo esse susto, que no final das contas passou despercebido, o jantar. Uma bela caldeirada com lagostas, camarões e peixes que foi devidamente destruída (o susto não foi grande o suficiente para me tirar o apetite!).
Fui para o meu ninho de lençóis e lona e lá fiquei admirando o céu, pontilhado de estrelas cadentes, quando fui interrompido dessa meditação pela sempre linda e holandesinha Gisela Mata, nossa diretora de programa e causadora perpétua de suspiros, que sorridente e solícita veio ver se eu estava bem instalado.
__O que eu mais gosto nessa história de dormir aqui no convés, além das estrelas é que o vento faz os cabos dos mastros zunirem zunidos diferentes—confessei pensativamente.
__ “como se fossem uma harpa” __Trinou suavemente a linda holandesinha.
__ “Então dormimos em uma harpa flutuante, onde Deus toca suas músicas...” __Arrisquei meio poético.
__ “Nossa formiga (esse sou eu) que bonito isso!” __ E sem que eu esperasse me sapecou uma beijoca na bochecha!
 Bendito barquinho bonito!

Ps:
Esta crônica faz parte de um livro,Motel Córtex, e este que isto escreveu não teve chance de remete-lo para a Giselinha Mata que estava morando nos U.S.A..
    Ontem me falaram que ela foi atropelada e morta andando de bicicleta lá no Rio de Janeiro ... 
A Gisela foi companheira de viagens pelo Brasil e por muitos lugares exóticos. Rimos muito juntos, trabalhamos por infindáveis horas que ao lado dela pareciam fugidios minutos... Ela sempre brilhou pela garra, força e inteligência! Era espantoso tentar acompanhar aquela magrela carregando uma mochila com vinte e oito quilos, escalando o monte Roraima como se fosse um morrinho!!!
Uma grande profissional, uma ótima companheira de trabalho e de vida. 
Foi uma honra partilhar dos seus momentos! 
Só posso afirmar: O amor é para sempre!

Um comentário:

  1. Descanse em paz, linda holandesinha! Será que você já encarnou por aqui? Para onde tua frequência vibracional te enviou?

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