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terça-feira, 1 de julho de 2025

MINHA EXPERIÊNCIA DE E.Q.M. ( O acidente ofidíco em Alto Paraíso de Goiás).



     No alto do MORRO DA BALEIA , o leste estava escuro,  chuvoso e sem visibilidade,  enquanto que o lado oeste, desvelava um dia glorioso, o Sol rumava em direção ao ocaso magnífico,  e havia uma linda cortina de chuva, varrendo a paisagem da esquerda para a direita.  Um momento perfeito!

     Para se chegar ao platô que forma o Morro da Baleia , deve-se começar a escalada pela " cauda" da baleia, escalada essa, não muito fácil e que me custou umas cinco horas ( lembrando que na época,  eu contava com 36 anos), lá chegando, o viajante é presenteado com um cenário que faz valer o esforço. 
Do alto, pode- se descortinar uma das paisagens mais bonitas do planeta  e um lugar, conhecido entre as cidades de SÃO JORGE e ALTO PARAÍSO DE GOIÁS  , como Jardim de Maytreya, que já foi fotografado

e usado como cenário de um calendário de um famoso fotógrafo de paisagens, radicado na época,  naquela região... E infelizmente,  o tempo, roubou da minha memória,  o seu nome.
     Chegando então na " cauda" da baleia, comecei a caminhar por uma picada, já bastante batida e, no meio desse corredor, havia muitas moitas cerradas, o que me fazia saltar sobre elas, para evitar aquele mato alto.

Quando em dado momento,  atingi uma laje de pedras, sem mato do outro lado daquelas moitas, senti como que, uma arranhada no tornozelo esquerdo, nada de dor, apenas isso: uma leve arranhada.
Quando olhei para baixo para ver o que tinha me " espetado" o tornozelo,  observei uma enorme cascavel  saindo do meio daquelas moitas e, ao mesmo tempo, olhei para  a minha ⁸direita e vi, o que pensei ser, o restante do corpo do animal, chacoalhando os ramos do capinzal.

Eu não havia percebido que eram duas serpentes acasalando e cometi o equívoco  de achar que a serpente da direita, fosse a continuação de uma longa víbora,  onde fiquei estarrecido com o tamanho daquele bicho!

     O que posso dizer? Pulei em má hora e aterrisei bem no meio de duas cascavéis namorando!
     Faço aqui uma digressão,  pois a primeira coisa que me perguntaram, foi se eu havia chacinado as serpentes. E tenho que responder com um sonoro : não!  ____ Isso, não passou pela minha cabeça.  Não senti raiva da cascavel, pois morder intrusos era o seu mister, e eu havia invadido a casa , o habitat, daqueles belos animais, e bonitos, eles realmente o são. 

Fiquei uns instantes ali, tomado da Serenidade que esse fato me causou, e em momento algum pensei em matá-la ou fazer qualquer coisa violenta.
Na verdade,  analisando calmamente a situação,  vi que não tinha como chegar a tempo no hospital,  que ficava em Brasília, e distava umas três ou quatro horas de carro. Notei que estava na melhor das despedidas da vida aqui neste planeta,  aqui nesta específica frequência vibracional  .

Tendo um belíssimo cenário como moldura. E, por uns bons minutos, sentei na laje de pedra, num ressalto que bem lembrava uma cadeira, e quedei- me ali, imaginando  o que iria me ocorrer, e enquanto esperava, fui admirando a luz, o Sol que iluminava a chuva no horizonte,  o voo de um falcão,  todas essas coisas estavam ali, muito mais presentes do que em qualquer outra ocasião da minha vida.

Tudo ao meu redor exsudava certa qualidade de serenidade amorosa.
     Sentado ali naquela rocha, que eram os ossos daquela montanha, possuído de uma singular concórdia,  estava resolvido a esperar e observar como meu organismo reagiria a neurotoxina da cobra.

     Alguma outra coisa " interna" daquilo que penso ser a  minha mente,  tomou as rédeas  da situação e me pôs em movimento,  e então, levantei e comecei o longo processo de desescalar o tal Morro da Baleia, foi uma tarefa  que ali, naquele momento,  realmente  me pareceu uma tolice,  pois eu havia levado cinco horas para subir a montanha.  E fiz isso, estando de posse de todas as minhas faculdades físicas e mentais, mas agora, tendo na circulação sanguínea,  a letal neurotoxina da cascavel, que me dava cãimbras tão fortes e espalhadas por quase todos os centímetros do corpo!

Eu observava o meu braço e podia ver os músculos se contorcendo como se houvesse um animal rastejando ali embaixo da pele. E como isso doía! Sofri essas fortíssimas cãimbras nos músculos abdominais e era muito estranho  olhar para a própria barriga  e perceber como esses músculos ficavam " subindo e descendo ", como um efeito especial, desses que se assiste em filmes de terror.

Havia também,  algo errado com a minha coordenação motora, pois eu tentava caminhar em linha reta e terminava dando passos trôpegos à esquerda  ou à direita. 
A visão estava muito ruim, e padeci de visão-dupla. Para poder seguir o caminho rumo às faldas  da montanha,  era obrigado a encostar o queixo no peito e espiar " por cima dos olhos", pois a potente neurotoxina crotálica, tem a capacidade de fazer a íris dos olhos subir, como se estivéssemos olhando para a testa.

Essa maneira de caminhar era muito incômoda,  além do que, eu precisava usar os pés e as mãos  para ajudar na descida. Esse seria o jeito normal, a técnica de desescalar, não fossem as cãimbras que literalmente me " mordiam com dentes afiados", eram espasmos fortes e muito doloridos e não me permitiam dobrar os membros. Era como se meus braços e pernas estivessem  engessados nas articulações. 

Fui obrigado a me dependurar nas saliências das pedras da montanha,  da melhor forma possível,  olhar para baixo, o que era bem difícil,  por conta do transtorno ótico e soltar as mãos,  o que me fazia cair como um saco de batatas. Eu torcia para não quebrar uma perna ou o pescoço. 
Esse jeito de desescalar,  foi uma das coisas mais estúpidas que já realizei na vida, mas naquele momento não conseguia controlar o meu corpo, cada vez mais descordenado. E a neurotoxina estava rapidamente acabando com os comandos do meu sistema nervoso central.

     Foi com muito custo, com muito esforço  que consegui chegar ao sopé do Morro da Baleia, e quando lá cheguei,  debaixo de uma chuva torrencial, tropeçando nos próprios pés, eu ainda estava uns quatro quilômetros distante do lugar onde havia estacionado o carro, na  estradadinha vicinal de terra batida.
Não conseguia dar mais um passo sequer e desabei de cara numa poça de lama, e fiquei literalmente " borbulhando" imprecações e maldizendo a minha tola decisão de descer a montanha.

Pois, lá no alto daquele belo platô, pelo menos eu teria uma boa morte, apreciando a linda paisagem, com aves e animais selvagens ao redor, cairia duro, porém majestosamente entronizado naquela rocha e dono de uma invejável serenidade mental muito adequada para o momento.
Estava segurando o meu cajado de viajante, e usava meu chapéu de infantaria blindada de abas moles e realmente não fazia má- figura.

Mas não , resolvi buscar socorro e agora estou aqui ... No chão,  com metade da cara enfiada na lama e sem conseguir mover um músculo. Sentindo dores até na ponta da orelha! Como diria minha avó Maria Frassini,  che bella situazione di merda !
Quis a sorte, o destino, os extraterrestres,  ou seja lá qual força que controla nossas vidas, que Júlio, um gerente de banco, que conheci ali mesmo em Alto Paraíso de Goiás, resolvesse passear com a sua mais recente paquera, uma agrônoma colombiana linda, chamada " La Catalina", muito simpática e muito inteligente. 

     Assim, esses bons irmãos vieram e me encontraram na triste situação que descrevi. Caído na lama e pronto para entregar a taça de ouro ao seu verdadeiro dono e partir o cordão de prata.
Poderia continuar escrevendo sobre a sofrida correria que foi chegar até a cidade de Alto Paraíso de Goiás e colocar a minha carcaça dentro de uma providencial ambulância que, oito horas depois da mordedura da serpente, me deixava no leito da Unidade de Terapia Intensiva do Hospital  H- RAM que ficava na cidade de Brasília.  E para ser sincero, eu estava mais " para lá, do que para cá" ,pertinho de esticar as canelas...

     Enquanto desfrutava da hospitalidade do H- RAM , sofri grandes episódios alucinatórios causados pela neurotoxina da CROTALUS DURISSUS ( apenas uma serpente, das 30 espécies de cascavéis que ocorrem nas Américas,  está presente no Brasil).
Lembro que num desses momentos de alucinações,  eu conversava com uma moça loira, muito bonita, de uns 25 anos, trajada elegantemente,  como se fosse uma estrela de cinema europeu dos anos 1950. Ela usava luvas de pele de cachorro,  de cor verde e um casaco que aparentava ser muito caro.

Nesta alucinação,  que sob todos os aspectos era um lugar real, tridimensional e em nada se distinguia de outros lugares em que já estive, eu caminhava até um edifício muito grande e imponente, parecido com o Palácio de inverno do governo em Campos do Jordão,  São Paulo.  Ou com o prédio da prefeitura de Munique, na Alemanha. 

Confesso que me sentia um pouco desorientado e sentia que eu estava dando voltas por ali havia muito tempo, e comecei a caminhar em direção à porta principal daquela construção e, lá chegando,  novamente me vi frente a frente com a loira elegante e de luvas verdes de couro de cachorro. Ela, do alto dos seus vinte e poucos anos, me olhando nos olhos e se aproximando tanto do meu rosto que eu podia sentir o seu perfume e o calor de sua pele, um perfume muito sutil.

Essa moça me dizia, frases assim: " Para começarmos uma caminhada, devemos dar o primeiro  passo ". ____ Era só o que faltava! Perdido em tremenda confusão física e mental e tendo que aturar essa jovem à falar sandices! Isso não vai me ajudar à encontrar o meu caminho... Pensando esses pensamentos,  eu voltava sobre meus próprios passos e, enquanto me afastava daquele prédio e daquela mulher, percebia que uma " força" qualquer me obrigava a andar em círculos,  e isso aconteceu tantas vezes que o número e o tempo não tinham mais importância. 

     Este que isto escreveu, estava preso em uma alucinação circular, verde, doentia e aflitiva, mas extremamente real, eu poderia usar a palavra " sólida".
E ... Retomava a caminhada perdido em direção à porta daquele imenso prédio, onde pela enésima vez, escutava atentamente o que a jovem loira estava dizendo. E era sempre : " Para bater Palmas, devemos unir e separar as mãos "ou, então: " As folhas mortas das árvores caem" ... E é claro, esta pérola de sabedoria: " Para subir uma montanha, primeiro devemos achar a montanha ".

E a linda mulher me dizia estas frases com tal ênfase e eloquência,  lançando um olhar intenso e de grande urgência,  aumentando muito minha aflição e ansiedade,  o que me causava um grande sofrimento. 
Sentimento esse, que me fazia sair correndo em direção à uma escadaria que subia e circundava toda a construção. 

No alto, à esquerda desta escadaria, ouvi um rosnando animal, não dê raiva, mas quase um pigarrear bem discreto, com a finalidade de chamar a minha atenção. 
Olhei em direção ao ruído e ocultos na luz lusco-fusco do crepúsculo distingui cinco ou seis belíssimos cães pastores- alemães,  com a cor do pêlo puxado para o caramelo escuro.
Esses cães  eram impressionantes! Tinham o porte de verdadeiros leões e emanavam dignidade e realeza quase sobrenatural.

Passei muitas vezes por esses cães,  mas devido a obscuridade da luz crepuscular,  não os tinha percebido,  tão mesclados à penumbra estavam. Eles rosnaram/pigarrearam apenas para chamar a minha atenção. 
Fiquei ali, observando-os e eles devolviam esse olhar, que era carregado de inteligência,  sabedoria e bondade.

Sua postura majestosa e serena me fez pensar, se eu não estava diante de antigas esfinge vivas.
Esses cães,  falaram então comigo, em português,  com sotaque caipira do interior do Estado de São Paulo ! ! !


Frases curtas, expressando sua consternação pelo meu sofrimento.  Havia bondade em sua fala mansa, mas também  uma grande comicidade. Foi uma experiência  perturbadora conversar com aqueles cães...
Eu virava as costas e continuava a correr em volta daquela monumental construção,  onde invariavelmente encontrava a jovem loira e acabava ouvindo algo do tipo: " Uma gota d'água brilhando ao Sol é apenas uma gota d'água brilhando no Sol". OÚÚÚFF ...

     Sucumbi a outro tipo de alucinação, este outro tipo, acontecia sempre que eu me encontrava no quarto do hospital e assim que fechava os olhos, no mesmo instante começava a enxergar,  com os olhos da mente, texturas,  que imagino eu, algum tipo de capacidade sensitiva , me permitiu " ver imagens " que pareciam um " pedaço de bife- frito" ou o interior amassado e emborrachado e úmido de algo que parecia o interior de um saco de papel pardo, desses de padaria ( papel pardo kraft).

     Sofri igualmente visões do interior de algum tipo de mineral.  Essas imagens vinham acompanhadas de uma sensação  de grande angústia e opressão insuportáveis!
Uma espécie de conhecimento interior, uma " voz" me passava algumas informações,  dizendo que aquelas imagens estavam relacionadas ao reino mineral ou a segunda dimensão. 

Também,  pude " ver" ( em oposição à apenas olhar) o interior do meu próprio estômago  e as paredes do mesmo estavam cheias de muco verde - amarelado.
" Vi" túneis  gigantescos e a tal voz me informou que aquilo era o interior do meu coração. 
Escutei minha respiração,  como uma ventania muito forte, como se eu estivesse dentro de uma caverna.

     A neurotoxina  proveniente do veneno desta Crotalus Durissus,  foi uma experiência real, seja lá, o que isso quer dizer. Algo que na falta de um exemplo melhor, poderia ser comparado à ingerir ayuasca,  só que bem mais vívido. Uma das substâncias  mais fortes e mortais que eu experimentei. 
E os efeitos devastadores me incomodaram por muitos meses, após a picada no tornozelo,  e 25 anos depois, ainda estou pagando o preço!

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